Tag: carro

  • A MAGIA E OS VAMPIROS – PT2

    A MAGIA E OS VAMPIROS – PT2

    O bate-papo entre vampiros é algo que merece uma atenção especial por minha parte. Imagine um asilo, onde todos os velhinhos estão com ótima saúde, senis e ainda com muita disposição para relembrar histórias e aventuras. Pois é mais ou menos assim que eu me sinto quando encontro amigos, ou faço novos neste meio.

    Hadrian nos trouxe novas visões do que até então tínhamos por verdade quase absoluta. A magia trabalhada por ele se aproximava muito daquelas que eu via sendo feitas por Kieran, só que de uma forma mais familiar. Era como se ele trouxesse vida a nossos corpos mortos e criatividade a nossas mentes. Poderíamos nós também adquirir tais dons?

    Eu já tinha ouvido falar de magistas que haviam sido transformados em vampiros, aliás, existem muitos clãs com esses indivíduos, porém o inglês grande, ruivo e de olhos verdes trouxe uma nova expectativa as minhas noites. Especialmente pelo fato de que ele mostrou interesse em se juntar a nós. – Vaguei por muitos lugares, conheci muita gente e o apreço que nossos mestres possuíam um pelo outro, me leva a crer que eu devo me juntar a vocês – Disse ele com sua voz grave e jeito de “bom vampiro”.

    Na noite seguinte fomos ao hotel em que ele estava hospedo para pegar suas bagagens. Uma espelunca no centro, provavelmente indicado por algum taxista maldoso que levou um por fora pela indicação. Apesar de tudo o que eu conto por aqui eu não gosto de lugares assim, sujos e cheios de mendigos ou drogados. Frequento-os apenas para me alimentar ou quando quero uma briga, então disse para eles agirem rápido.

    Mesmo naquela hora a rua estava movimentada, tive de parar o carro na entrada de uma garagem e como todo brasileiro, liguei o pisca alerta na intenção de amenizar o problema. Alguns minutos haviam se passado e paciência nunca foi minha virtude, sabe quando algo te incomoda e nem mesmo o Facebook no smartphone consegue te distrair? Lá fui eu acender um cigarro eletrônico, maldito vício que eu cultivei naqueles meses…

    Se não bastasse o lugar ruim e a espera, tive de ser incomodado por um mendigo atrás de cigarro. Faz a criatura entender que o cigarro era eletrônico e não dos normais… Eu estava quase dando o meu cigarro para ele, quando ouço três disparos vindos de dentro do hotel. Por instinto me abaixei atrás do carro, olhei para os lados e aparentemente só minha audição aguçada havia escutado os disparos.

    Dei um chega para lá no “sujismundo”, travei as portas do carro e liguei para Sebastian. No caminho até a recepção do hotel ele me atendeu e sussurrando me alertou para que os aguardasse no carro. O que diabos eles haviam feito? Cheguei a pensar em  ir ao encontro deles, mas aceitei o seu pedido e voltei para o carro. Ao voltar para a rua uma surpresa, o tal mendigo havia largado o cobertor, boné e jaqueta no chão. Extava apenas com as calças e uma regata que exibia seus braços tatuados. Ainda se não bastasse o que estava acontecendo o filho da puta estava tentando arrombar meu carro…

    “…Run, Pig, Run
    Here, I , Come
    There is no safe place
    There is no safe place
    There is no safe place to hide…”

  • Boemia e vampiros na década de 40

    Boemia e vampiros na década de 40

    Sei que já faz algum tempo que não falo de minhas tantas histórias do passado, mas hoje eu vou contar sobre algo que ocorreu comigo no Brasil antes de eu hibernar. A data como sempre é algo que está em alguma esquina oculta de minha memória, apesar disso, provavelmente foi na década de 40. A cidade foi o Rio de Janeiro, local no qual eu não tive muita tranquilidade e que foi decisivo na minha ideia de dormir por alguns anos.

    Pois bem, era uma época ímpar, a época do alge dos ”malandros” que enchiam os bares todo final de tarde para tomar cerveja, namorar, trapacear e obviamente tocar Samba ou Bolero. Para quem não conhece esses ritmos, eles eram algo musical que deram origem ao pagode e a outros ritmos nacionais populares brasileiros de hoje. Inclusive acho que foram eles que originaram esse tal de Funk, que na minha opinião é um ritmo de gosto duvidoso.

    Então lá estava eu no verão do Rio de Janeiro, em plena praia de Copacabana próximo das 20 horas. Um local pacato apesar dos grandes prédios e hotéis como o Palace que já circundavam a região naquela época. Lembro-me como se fosse ontem do cheiro de vacas que vinha do estábulo do seu José Marques. Um português que vendia leite recém ordenhado e também de algumas pessoas que ainda circulavam pelas ruas em seus cavalos, afinal os carros ainda eram muito caros.

    Eu andava a pé em direção ao Cassino Atlântico, que inclusive foi fechado um pouco depois desse episódio em 1946. Vejo passar por mim um carro barulhento e dentro dele uma mulher e um mancebo. Percebi algo sobrenatural na mulher, mas nada muito forte e continuei minha caminhada.

    Ao chegar no estabelecimento, senti novamente aquela presença da tal mulher do carro. Dou umas voltas pelo local. Várias mesas, uma roleta, e claro várias salas com carteado. Nunca fui muito bom no carteado, mas o pôquer sempre me atrai e resolvi entrar em uma das saletas para algumas partidas.

    Fiquei um tempo entre os gracejos dos senhores e de suas damas de companhia. Ganhei algumas partidas, perdi outras e resolvi parar  depois de umas nove ou dez rodadas. Logo que sai da saleta eu sinto a presença e ao longe a tal mulher. Ela usava um vestido vermelho um pouco curto para a época, um salto alto e um chapéu branco decorado com penas pretas. Ao seu lado estava o tal mancebo que dirigia o carro barulhento. O tal cara era um figurão, vestia uma calça bege, chinelos e um blazer da mesma cor da calça, mas sem nada por baixo deixando a mostra o seu peito e barriga torneados e bronzeados. Ou seja um belo rapaz rico com uma meretriz?

    Ok os humanos até podiam pensar dessa forma, mas eu percebi ao vê-la de perto que era uma vampira nova. Como estava sem o seu tutor, acredito que estava nas suas primeiras caçadas sozinha ou em algum teste de habilidade.

    Aproximei-me e acenei com a cabeça quando passei por eles. Percebi que ela me cumprimentou um pouco desconfiada, mas continuei em direção ao salão principal. Já no salão resolvi brincar um pouco com os dados e não demorou para que uma meretriz se aproximasse. Neste dia eu estava bem barbeado e apresentável, usando uma calça preta, um sapato sem meias e uma camisa branca dessas que mostram um pouco do peito e mais soltas no qual eu não sei o nome.

    Logo de cara a moça ficou com a mão na minha cintura, percebi que ela queria algo a mais que minha carteira e dei a chance dela mostrar o seu serviço. Entre algumas caricias e afagos resolvi que a moça precisava de um pouco de afeto e lhe disse que ela podia me acompanhar pelo restante da noite. O engraçado é que esse tipo de mulher nem se importa com o meu toque gelado e algumas chegam até a achar que é charme e querem me aquecer.

    Entre chamegos e carícias me surge novamente a mulher de vermelho com seu mancebo que já estava bem alcoolizado, falando alto e cambaleando. Não demorou para que ele tropeçasse em algo e fosse ao chão. Como estava perto aproveitei para me aproximar, lhe ajudei a levantar e ir até o carro. Deixei minha companhia dentro do cassino e fui matar minha curiosidade, mesmo sabendo que isso poderia atrapalhar a caçada da vampirinha, afinal algo tinha me atraído nela.

    Já no carro a senhorita de vermelho me fala.

    – Obrigado, mas eu não sei como ir embora, pois não sei dirigir.

    Então eu circulo em volta do carro, vou em sua direção e próximo de seu ouvido sussurro algumas palavras:

    – Coitadinha da pobre dama indefesa que não sabe dirigir.

    De imediato pela aproximação ela percebeu que eu também era vampiro. Deu um passo para trás e com vergonha me diz com sotaque espanhol.

    – Desculpe ainda não sei reconhecer bem os nossos.

    E assim eu havia conhecido a Delcine, uma vampirinha novinha,  um cassino breve que tive e que mais tarde inclusive passou um tempo na Europa com minha irmã Eleonor. Até que ela era bonitinha e jeitosinha, mas era um tanto burrinha e alguns anos depois, enquanto eu já hibernava, ela foi assassinada por um caçador.

    Ahh sim o que fizemos depois que nos conhecemos no carro? Passamos algumas noites usufruindo dos luxos daquele seu mancebo. Uma das poucas e boas lembranças daquela época e daquele lugar.