Tag: Surpresas

  • Os mortos não voltam – Parte V

    Os mortos não voltam – Parte V

    A música tocava alto demais para meus ouvidos sensíveis, e apesar de conseguir controlar isso, naquela noite eu estava extremamente desnorteada. Olhava ao redor procurando alguém com quem pudesse conversar. Alguém que fosse útil, talvez. Sophie resolveu dar uma volta com Lilian, que a todo instante perguntava se eu estava me sentindo bem, e não queria deixar-me sozinha, depois que contei os últimos acontecimentos e depois que mencionei estar com maus pressentimentos. “Relaxa um pouco e vamos nos divertir”. Sentei próxima ao balcão do barzinho e pedi uma bebida. Observando todos naquela festa, por um instante pensei que tudo aquilo era uma miserável perda de tempo. Lorenzo estava em apuros e eu estava ali, no meio daquela gente bêbada e alterada.

    – Você é daqui?

    – Oi? – Não percebi que alguém civilizado havia sentado ao meu lado.

    – Você… Nunca lhe vi por aqui. Aqui todos se conhecem…

    – Então, deve conhecer a Lilian. Vim com ela. – Falei sem olhar para ele, concentrada nas últimas gotas de meu Martini.

    – Ah sim, conheço ela de vista, Hélder, muito prazer. – Falou estendendo uma das mãos.

    Cumprimentei aquele rapaz que a principio não parecia interessante. Mas, como boa observadora que sou, percebi em seus olhos azuis outras intenções ao falar comigo. Após trocar algumas frases em meio a uma conversa desconexa, percebi que ele tinha uma tatuagem no pescoço, logo abaixo da orelha. Era um símbolo. Ele era um bruxo. Lembrei-me imediatamente do retrato de Thomas e Antoni, que por sinal, ainda estava no bolso da minha jaqueta. Minha memória visual era ótima. O símbolo tatuado naquele rapaz era o mesmo que Antoni tinha em suas mãos naquela imagem antiga. Percebi que eram do mesmo clã. Então, me perguntei se Thomas, que tinha em suas mãos o outro símbolo, o mesmo marcado na parede de meu apartamento, pertencia ao clã inimigo. Olhei para ele curiosa e ainda confusa com meus pensamentos, as peças estavam se encaixando, e acabei sendo impulsiva demais ao perguntar:

    – Você conhece algo sobre o clã de bruxos demônios? Conhece Antoni Erner?

    – Do que está falando?- perguntou surpreso, semicerrando os olhos e depois tentando disfarçar- Hahahahah, olha…acho melhor beber mais um drink, por minha conta, e vir comigo, vocês precisam esperar aqui….

    Sem entender nada, acabei tomando drinks que não devia, e havia algo na bebida que inexplicavelmente surtiu um efeito sobre mim. Não lembro como acabei indo dançar com aquele rapaz desconhecido. Mais tarde, Lilian e Sophie juntaram-se a nós estranhamente risonhas. Lembro-me que minha tensão passou por algumas horas e em alguns momentos, eu já nem sabia por que estava naquela festa. Lorenzo parecia estar ali comigo, sorrindo, dançando. Seus olhos verdes correndo sobre mim. Senti seu beijo adocicado em meio a um sorriso. De repente, uma forte dor de cabeça atingiu-me. Delirando, ouvi apenas:

    – Durma bem, minha pequena.

    Quando acordei, não sabia ao menos que horas eram. Se era noite ou se era dia. Estava zonza. Com certeza teria uma ressaca daquelas. Vi Sophie adormecida entre dois rapazes. Alguns bêbados perdidos. Encontrei-me junto a Lilian, vestindo apenas minha saia e meu sutiã. Quando dei por mim, comecei a perceber e a lembrar tudo o que havia acontecido. Caramba. A festa havia rendido. Olhei para Lilian. Nos beijamos? Pensei. Não. Foi mais do que isso. Mas havia sido bom. No momento tornou-se engraçado. Levei as mãos à cabeça. Durma bem minha pequena… Olhei ao redor. Então percebi, havia uma presença estranha e ao mesmo tempo familiar ali, nos observando.

  • Mais algumas lembranças de Becky –  Final

    Mais algumas lembranças de Becky –  Final

    Algumas horas se passaram, tive tempo de analisar tudo o que havia dentro daquela sala. Pela janela percebi que estava a algumas horas do amanhecer e imaginava alguma maneira de sair daquele lugar. Estava apreensiva pelo que poderia acontecer em seguida. Até que finalmente alguém abria a porta. Mas, de súbito paralisei e meus instintos farejaram algo familiar como se eu já conhecesse quem entrava. Virei-me devagar. Ela me observava como se pudesse ver-me por dentro.

    Durante alguns minutos permanecemos assim, olhando uma para a outra.

    -Sente-se Rebecca… Humm, agora entendo porque fui deixada para trás. É muito mais bonita pessoalmente.

    Olhei-a com desdém. Também era uma vampira tão bonita quanto eu, porém mais velha e mais forte. Era um pouco mais alta, tinha os cabelos longos e loiros, em contraste com sua pele morena- pálida.  Mas, o que queria comigo, afinal?

    – Não sou uma inimiga. Queria apenas vê-la. Logo vai poder sair daqui e seguir seu rumo. Assim, como irei seguir o meu. Mas, antes preciso lhe falar algumas coisas. O mais engraçado, é que tudo o que sobrou da minha vida está fragmentado em você. Todas as minhas lembranças. Toda a vida que eu não vivi. Mas, eu tive sorte ao final… Quando você nasceu, eu já estava transformada, Erner era “amigo” de sua família, e eu também era, sim, conheci seus pais Rebecca. Mas, ele imaginou todo o seu futuro e ficou obcecado por você. Ele era assim, sua possessividade o fazia manipular suas vitimas ao máximo até tê-las totalmente sobre seu domínio. Mas, com você foi diferente, ele te acompanhou desde sempre, teve você nos braços ainda criança, e então, cansou-se e me descartou. De certa forma ele te amou.

    – Eu já sei de tudo isso. Olha, eu não tenho culpa do que possa ter te acontecido.

    -Não, não tem. Por isso precisava olhar nos seus olhos. Eu não o amava como você o amou, mas mesmo assim, não pude fazer o que fez. Eu vim te agradecer. Pois, deu aquele homem o seu destino merecido.

    -Já acabou? Já falou o que precisava?

    – Espero que compreenda e me desculpe pela maneira que lhe trouxe até aqui.

    Dei uma risada nervosa, olhei para aquela que eu conhecia como “Sophie”, e sai daquele lugar o mais rápido que pude. Tudo aquilo era estupidamente desnecessário. Ela veio me agradecer pelo sofrimento que causei a quem mais amei, mesmo com tudo o que havia me feito, e aquilo mesmo que eu não quisesse, me dilacerava e doía.