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  • Uma nova jornada – Parte VII: o isolamento e a insanidade

    Uma nova jornada – Parte VII: o isolamento e a insanidade

    Ao fechar a porta do quarto senti o silêncio invadir minha alma. Eram apenas sete dias. Só sete dias. Eram longos sete dias, e noites…  Olhei ao redor.  No quarto havia algumas janelas trancadas por cadeados.  Um detalhe antes despercebido. Tudo era muito confortável e iluminado, ao menos. Havia uma cama grande com cobertores macios e travesseiros altos, como eu gosto.  Um armário com minhas coisas. Sem celular, internet ou algo do tipo. Uma mesa na lateral. Uma cadeira. Uma poltrona. Na mesa alguns livros, canetas, lápis e folhas de papel, o que eu precisava para me manter ocupada por um tempo. Olhei o banheiro com mais atenção. Chuveiro grande, uma banheira, sais de banho, toalhas macias e muitos espelhos. Fechei a porta do banheiro.

    Olhei o quarto novamente e percebi que ao lado da cama havia algumas folhas impressas. Sim, as instruções. Sete dias… Bufei e revirei os olhos ao lembrar isso.  Mas, por enquanto, eu tinha o que fazer. Ler. Sim, ler as instruções.

    “Conforme o determinado e de acordo com o procedimento padrão de nosso clã, seguem as instruções e observações julgadas como essenciais para o ritual de purificação e iniciação na qual o iniciante deve se comprometer a seguir os ensinamentos e conduta a ele transmitida. Após um conhecimento aprofundado a cerca do histórico, métodos e objetivos do clã. O iniciante deverá passar por rituais e processos de preparação que o auxiliará a usar seus dons e poderes de acordo com os fundamentos e objetivos do clã. Parte desse processo consiste em um isolamento do iniciante, que pode variar de 7 (sete) à 10 (dez) dias e noites consecutivos, na qual o objetivo se dá no afastamento de intervenções externas, a fim de que o iniciante aprofunde-se em si mesmo. Juntamente com o Jejum que auxilia a conexão do individuo com as energias e…”

    Pulo algumas páginas, tentando me concentrar na parte burocrática e no blá,blá, blá da coisa. Leio mais alguns trechos com algumas instruções e percebo que definitivamente já estou entediada. As horas passaram e me distrai com alguns livros. Refleti sobre assuntos pessoais, lembrei-me de momentos com Lorenzo, da última conversa com Antoni na sacada, lembrei do vislumbre que a vista de lá me trouxe e da sensação de paz. Lembrei-me de Ferdinand também claro, como esquecê-lo? Meu amigo. Guardando esses pensamentos comigo, entreguei-me aos travesseiros, na cama, abraçando-os com força e, então peguei no sono, deveria estar amanhecendo lá fora, calculei.

    “-Hey minha pequena, Rebecca. Venha cá, senhorita.

    Relutei por alguns instantes, mas se eu não fosse certamente ele me buscaria. O que seria ainda pior. Ao me aproximar, ouvi o tilintar do gelo em seu copo de whisky, percebi seus pequenos olhos negros seguindo cada movimento meu. Seu olhar brilhava sordidamente, um olhar que revelava seus pensamentos e planos mais obscuros e insanos.

    -Sente-se… Aqui. – Falou usando as mãos para dar tapinhas leves nas próprias pernas.

    Tal ordem me fez engolir seco. Obedeci com repugnância e ao mesmo tempo curiosidade. Sentei em seu colo olhando para o chão e trêmula senti suas mãos roçarem minha nuca. Calafrios. Seguido de seu nariz, que desenhava círculos em meu pescoço.

    – Rebecca. És tão… Deliciosa. Olhe para mim. – Falou fazendo-me carícias e puxando-me pelo queixo.

    Pensei alguns segundos e então o encarei. Seus olhos negros, pequenos e brilhantes. Observei seus lábios entreabertos e me aproximando dei-lhe um beijo sem jeito e desengonçado. Um beijo retribuído com força. Suas mãos me apertavam e me faziam arquejar. Então, suas mãos apertaram meu pescoço, erguendo-me. Arrastou-me e jogou-me contra a parede, de costas.

    – Boa garota, sempre voraz ao final, agora terás o que merece. – Falou enquanto afrouxava o cinto.”

    Acordei sobressaltada. Acho que meu sonho havia virado pesadelo. Ele nunca sairá de meus pensamentos. Maldito Erner.  Levantei pensando em algo para passar o tempo. Enchi a banheira e fiquei algumas horas de molho, relaxei e quase adormeci de novo. Havia mais cinco dias e noites para passar aqui. Suspirei desanimada…

    Dia/Noite 3: “Já li dois livros. Fiquei três horas na banheira, de novo. Li um pouco das instruções. Nas instruções diz para meditar. Eu costumo fazer isso sempre. Mas aqui, assim não tem graça. O silêncio é irritante. Faz tanto tempo que não sinto o silêncio com tanta intensidade. Quero sair daqui. Mas tenho que aguentar, só mais… Quatro dias… Vou tentar meditar, é o que resta.”

    Dia/Noite 4: “Meditei tanto que quase fui parar em outra dimensão. Será que isso é possivel? Acho que sim, talvez. Caramba, quanta fome! Nunca fiquei tanto tempo sem me alimentar. A fome me deixa irritada. Merda, porque diabos eu concordei com isso?”

    Dia/Noite 5: “Tédio. Já li todas as instruções, todos os livros, rabisquei todas as folhas, quebrei todos os lápis. Contei todos os pequenos desenhos do papel de parede. Não tomei banho, estou um trapo. Enrolada nos cobertores, por cima de todos os travesseiros. Com o roupão preto. Encaro o teto por horas. Preciso sair daqui. Desse quarto. Desse isolamento. Dessa insanidade que começa a me atingir. Acho que vou dormir novamente.”

    Dia/Noite 6: “Amanhã vou sair daqui. Falta pouco. Só mais hoje. Amanhã vou sair daqui. Fome. Que ódio.Vou tomar um banho e ficar mais apresentável para quando Erner, digo, Antoni chegar. Por que são tão parecidos fisicamente? Porque são gêmeos, idiota! Eram gêmeos. Você matou Erner, não lembra?”

    Olhei-me no espelho. Vi minha beleza refletida. Eu matei Erner. Aquilo fazia tanto tempo. O mundo estava tão bem sem ele. A chuveirada que tomei alguns instantes atrás havia sido renovadora. Mas, senti que mais alguns dias dentro daquele quarto , em jejum, e eu começaria a ficar louca. Mais do que eu já estava me sentindo.

    “Amanhã. É amanhã. Amanhã vou sair daqui.” Pensei.

  • A vampira pin-up – pt6

    A vampira pin-up – pt6

    Durante aquela noite eu não pude fazer muitas cousas, além de indagar o mensageiro sobre quem havia entregado a caixa e dar uma olhada pela região próxima ao hotel. Sobre o entregador, não consegui nada além do fato de que havia sido um garoto do serviço de entregas. Com relação aos quarteirões próximos ao hotel eu vaguei por horas em busca de algo, mas não havia nada de suspeito nos telhados, becos ou lugares que invadi em forma de névoa.

    Antes do amanhecer eu voltava para o hotel, quando alguém passa muito rápido pelas minhas costas. Naquele momento, que durou pouco mais de 2 segundos, eu senti uma energia boa e que até havia dado a impressão de ser Eleonor e que me assustou um pouco pela surpresa. Porém, nada ao redor além de carros estacionados e alguns poucos infelizes, que recém haviam acordado e provavelmente iam para sua labuta diária.

    Novamente no quarto de hotel e por sorte alguma camareira havia arrumado o lugar na minha ausência. Desolação era o sentimento que mais marcava presença em minha cabeça naqueles dias e noites. Certamente, quem teve a infeliz ideia de me provocar, na tentativa de que eu pudesse refletir sobre tudo o que havia acontecido comigo, o fez num momento absurdamente errado.

    Durante aquele dia nublado, alguns raios de sol conseguiam transpor as nuvens e se chocavam contra a cortina furada do quarto, proporcionando um ambiente mais tenso ainda. Planos, ideias, medos e filosofias se chocaram na minha cabeça. Inclusive a página de meu diário em que deixei anotado esta passagem está com as letras muito borradas  e malfeitas, demonstrando a tensão do momento.

    Então veio mais uma noite e com ela o mais completo desânimo, outro dia em claro e se isso é péssimo para um humano, imagine para um vampiro que possui preocupações maiores ainda… Entre tanto, tudo mudou de figura quando recebi uma nova ligação da recepção e o garoto me informou que havia uma garota querendo conversar comigo pessoalmente. Naquele instante eu me preparei, deixei a porta aberta e a aguardei em forma de névoa. Para o momento e pela surpresa foi o melhor plano que tive.

    Alguns minutos depois ela deu duas batidas na porta e entrou furtivamente. Era uma garota nova, cerca de 20 anos, humana e aparentemente não me ofereceu nenhum perigo. Naquele instante eu já estava desfazendo a transformação para poder pegá-la de surpresa, quando ela me surpreendeu com um texto provavelmente decorado.

    – Senhor Ferdinand, eu vim busca-lo para que ele possam negociar pessoalmente com o senhor a libertação de sua irmã. Por favor apareça onde estiver, o senhor precisa de mim para chegar até lá.

    Mesmo assim, agarrei a garota por trás e travei minhas presas em seu pescoço. Pensar por tanto tempo havia me deixado com fome e não pude negar um belo pescocinho como aquele. Controlei a fome para não matá-la, lambi a ferida para cicatrizar mais rápido e por fim larguei-a desmaiada sobre a cama. Pedi um lanche para quando acordasse e aguardei ansiosamente ao seu lado.

    Uma hora depois ela acordou muito fraquinha e me perguntou onde estava e o que estava fazendo em minha cama. Evidentemente e para minha tristeza haviam feito algum ritual ou hipnose com a coitada, e só me restou usar a lábia para convencê-la de que eu estava apenas ajudando. Depois conquistar parte de sua confiança, acabou me confessando que estava na rua voltando da faculdade, quando foi abordada por uma mulher mais velha que ela. Alguém de cabelos escuros, pele clara e grandes olhos azuis. Descrição muitíssimo similar a de minha querida Eleonor…