Categoria: Histórias

Nesta seção você encontra historias, contos e relatos relacionados ao mundo real e sobrenatural. Verifique a indicação de faixa etária no início de cada texto.

  • O retorno – pt1

    O retorno – pt1

    Pisar nestes mesmos locais depois de tanto tempo ainda me parece estranho. Me afastar dos clãs me fez perceber o quanto eu me afastei de uma parte de mim mesma. Na vida de todo mundo, acredito que devemos as vezes nos afastar até daquilo que consideramos importante para poder assim respirar, ter um tempo para nossa limpeza interior e começar a caminhar tudo de novo com mais clareza.  

    Afinal cabeça turva nunca foi uma boa conselheira para ninguém. 

    Depois da conversa com Ferdinand no qual eu rasguei meu coração e agora tento catar os pedaços, sinto que ele está cada vez mais preocupado comigo… Entre as mensagens e conversas por telefone (evitando as vídeo chamadas que entregam o que eu penso sem ele me perguntar e que agora ele vai descobrir) o vampiro não tenta esconder sua preocupação, ainda mais agora que sabe para onde eu estava indo.  

    • Lili, cara, tens certeza? Sei que tens teus deveres lá, mas sinto que ainda precisa dar uma segurada, se recuperar… 
    • Fê, apesar de tudo eu ainda tenho autoridade lá dentro, o clã respeita minhas decisões e na real, o que são estes poucos anos fora, perto da idade dos vampiros de lá? Não passam de meros dias para eles. 
    • Ok, apesar de não concordar… Enfim, vê se não faz nenhuma loucura… 
    • Cara quanta preocupação, eu disse que eu “te amo” e não que “fiquei retardada” … 
    • Sei, já tô sentindo que vais me dar dor de cabeça e olha que eu sou um vampiro. 
    • Da pra você relaxar? Eu vou ficar bem. 
    • Tá, mas se estiver numa situação ruim me chama e vê se não entras na toca de novo! 
    • Pode deixar. Beijos Fê. 
    • Te cuida Lili. 

    Ao relembrar minha conversa com ele, me recordo de que o Fê não era o único vampiro que me decifrava no olhar, ao longe com um grande sorriso branco e seus proeminentes caninos de vampiro, vejo Trevor, um dos meus maiores portos seguros caminhando em minha direção enquanto eu entrava pelos grandes portões do nosso clã, o vampiro conhecido por sua óbvia altura, até mais alto que o Fê, seu bigode por fazer e o senso de humor mais sarcástico que o meu, me era nesse instante o abraço de que tanto precisava, o conforto de que tanto almejei por estes dias até chegar aqui novamente. 

    • Então a nossa querida general está de volta! 
    • Não precisa me lembrar da minha patente neste local… Quanto tempo meu querido T! 
    • Lili, saiu da toca finalmente! Eu senti muito a tua falta. 

    Vocês identificam cheiros com as pessoas que você gosta? Eu faço isso desde quando era humana e depois quando me tornei vampira este pequeno fato me acompanhou na minha vida imortal. Charuto cubano, sangue e o tom amadeirado do perfume do meu querido Trevor tomavam conta dos meus sentidos. Apesar de ser alta, ele assim como o Fê, me faziam sentir abraçada e protegida por completo. 

    • E como foram as coisas lá como galegão galanteador? 
    • Podemos deixar essa conversa para depois? Ainda estou tentando catar todos os cacos. 
    • Entendi, não foi uma conversa animadora… 
    • Gostaria de dizer que sim, porém, melhor deixar esse assunto para depois, bem depois. 
    • Lili, acredito que a conversa aqui também não seja das melhores desde que você deu um fora no vampirão daqui e saiu para se isolar de tudo… 

    Eu sai para me isolar de tudo e sinceramente estar aqui entre as paredes da Ordem me fez recordar muitas coisas, inclusive o fato de que eu jamais veria meu grande amigo Steve de novo… A história da morte dele foi um baque e enquanto estou na sala do conselho da Ordem ao observar a parede de homenagem para os que se foram, lá está Steve olhando para mim como quem diz “Não fraqueja cara, você é melhor que tudo isso!”. Sim ele estava lá e pareceu que eu retrocedi alguns anos atrás revivendo o dia da sua morte. O corte que recebi em minhas costas naquela noite fatídica, deixaram uma cicatriz no meio das minhas tatuagens. Meu amigo lobo deve estar correndo por entre as estrelas, uivando noite a dentro. Ainda tenho o vídeo dele guardado no meu drive, sorrindo e confuso em como mexer na porcaria do celular. 

    Steve foi homenageado pela Ordem por ter me protegido… Por alguns minutos fiquei de pé observado a imagem dele até sentir um poder bem conhecido por mim, sim a presença dele era gigantesca e quando me dei por conta ao virar, lá estava ele de braços dados com uma vampira ruiva muito bonita que logo foi deixada um pouco de lado enquanto o vampiro dos cabelos platinados caminhava até mim e Trevor. 

    • Vejo que continua a mesma, apesar dos longos cabelos negros, que lhe caem muito bem aliás; e seu olhar mudou, não parece a mesma teimosa vampira que fugiu daqui como uma criança arisca. 
    • Jonathan, vejo que não conseguiu me esquecer. Corrigindo, eu não fugi, apenas fui embora. 
    • Podia ter ficado, mas entendo que precisava desse seu tempo sabático.  
    • É bom te ver novamente também se esse é teu jeito de se expressar. 

    Jonathan sorriu, continuava lindíssimo de chegar a doer os olhos. Como sempre ele tocava meu cabelo delicadamente e analisava cada centímetro meu enquanto eu observava o olhar fulminante de sua acompanhante.  

    •  Creio que tenha sentido falta das suas velhas amigas. 

    De forma elegante o vampiro foi até a mesa no meio daquela grandiosa sala e com maestria retirou da bainha as minhas duas katanas que me acompanham desde o começo de tudo. Ao segurar minhas antigas e majestosas espadas que estavam mais afiadas do que nunca, senti um pouco daquela guerreira adormecida por estes anos de distanciamento, reaparecer. 

    • Minhas espadas, posso saber o motivo? 
    • Afinal voltou para sua primeira morada imortal, deves carregar seu armamento e retornar ao teu posto minha cara. Aliás, seria ótimo para você, te ajudaria a esquecer o vampiro que roubou teu coração. Não vejo utilidade na tua vida ao se lamuriar por conta disso. 

    Pelo visto ele sabia o que tinha acontecido e seu olhar mostrou nitidamente que não gostava nada da novidade. Ao retornar para sua acompanhante, agora sem dar as mãos para a vampira que parecia frustrada, Jonathan ainda de costas para mim deu um último recado. 

    • Teus aposentos estão prontos, nos vemos em uma hora nesta mesma sala pois, assuntos importantes nos aguardam. Não se atrase Lilian. 

    Senti que eu não fui até lá apenas para matar as saudades. 

  • Status quo vampiro: Problemas – pt2

    Status quo vampiro: Problemas – pt2

    Algum tempo depois do papo com o Regrado. Encontrei-me com Julian num bairro de subúrbio. Tal lugar povoado em sua maioria por operários e suas famílias muito próximos dos galpões das fábricas, também servia de quartel general para as operações do seu clã.

    – Aqui não é nosso “lar”, mas temos dois ou três velhos dormindo. Preferimos manter os coroas separados, sabe? Não temos tanto espaço como vocês na América…

    – Sei, mas é uma estrutura antiga, pelo que vejo.

    – Aye, esses prédios aqui e os prédios que tinha antes, têm algo perto de 1000 anos de construção. Da uma olhada ali na quela parede, tem uns desenhos, acho que foi algum Danish que fez.

    – Viking?

    -Aye, algum puto dinamarquês ou norueguês!

    – Esse sentimento é próximo quando os brasileiros falam dos portugueses… mas e ai, acha que tudo certo pra gente viajar amanhã?

    – Daqui a pouco a Megs tá aqui e vai ajudar a gente nessa. Ela é meu braço direito e esquerdo, acho até que ela manda em mim e eu deixo, cara!

    – Tua cria?

    – Nada tolo, foi transformada pelo meu coroa pouco tempo depois de mim, a gente aprendeu tudo junto. Sabe, os velhos querem dormir ai vão transformando geral, até achar alguém que cuide deles e dos negócios. Você sabe bem, eu acho?

    – Sim, tô nessa depois daquela guerra maldita. Por que não conheço a Megs?

    – Merda, não me lembra, foi por pouco que a gente se safou, mas foi bacana encher o cú daqueles putos de bala ou rasgar suas carnes podres! A Megs passou um tempo na América depois acho que veio pra cá e você deu uma de velho e foi dormir uns anos…

    – Desencontros, meu amigo…

    Uma vampira singular

    Fomos interrompidos por uma passada firme de calçados femininos, de alguém que vinha até nós.

    – E ai papinho tá bom heimm! Bora mexer essas bundas brancas, seus desgraçados!

    Surgia por uma das portas Megs. Outra com sotaque daquela região. Loira de olhos azuis, pele branca com sardas e baixa estatura. Ela deve ter pouco mais de um metro e meio, mas tem uma energia que supera sua altura. Ah ela fala pelos cotovelos, mas quem sou eu para criticar isso rsss

    – Meggie, que todos chamam de Megs, esse aqui é meu amigo Ferdinand…

    Julian iria continuar, mas ela se antecedeu e me estendeu a mão. Apertamos com firmeza, enquanto eu me levantava da cadeira.

    – Bloody hell! Não se levanta não, prazer em te conhecer. O moço ai sempre se gaba das histórias da guerra e de quantos endiabrados vocês mataram. Acho que ele só teve essa aventura depois. Que virou sanguessuga hahaha.

    – Não enche o saco Megs! E ai, o avião tá pronto?

    – Aye, but! Acho que já estão sabendo das investigações.

    – Como assim? – Perguntei preocupado.

    – Parece que teve gente estranha perguntando sobre o avião com destino a África. Pode ser algum curioso, mas é bom ficar com os dois olhos abertos.

    Problemas num lugar inóspito

    – Mayday… mayday… mayday… Perdemos a turbina… Iniciando procedimento de emergência!

    Caímos!

    Antes que o avião tocasse o solo consegui fazer minha transformação em névoa, mas Julian, o piloto e o copiloto não tiveram a mesma sorte. Alguns destroços se espalharam num rastro misturados a galhos, vegetais e alguns pedaços de corpos e vísceras.

    Chamei por Julian e a sensação de proximidade com outro sobrenatural era muito fraca, quase imperceptível. Mesmo assim persisti e com a ajuda de alguns pontos de incêndio cheguei ao local onde a parte maior da aeronave estava. Junto a ela mais pedaços da fuselagem, misturados a restos animais e em próximo do que parecia ser uma poltrona estava o corpo de Julian bastante contorcido e quebrado. Ao menos inteiro.

    – Hey, consegue me ouvir? –  Tentei por uma, duas, três vezes e não tive retorno. Fiz o que me era possível, improvisei uma maca, posicionei seu corpo de tal forma que me parecia o jeito mais correto e fui atrás de sangue.

  • Status quo vampiro: intro – pt1

    Status quo vampiro: intro – pt1

    Nos últimos anos eu tenho passado muito tempo na fazenda. Certamente, foi o local onde a Pepe e eu nos sentimos mais confortáveis em passar um tempo, em especial ao longo da pandemia. Nela, guardamos nossos bens mais preciosos, os anciões hibernam no subterrâneo e há espaço suficiente para a prática de nossos poderes.

    Inclusive, muitos dos aprendizados da Pepe tem ocorrido em meio as videiras, a conhecidíssima planta que gera a uva, no qual utilizamos uma parte para fazer vinho. Cabe aqui uma curiosidade! Tais garrafas por vezes nos servem como disfarce para meia dúzia de garras de sangue que sempre temos por perto para consumo próprio.

    Certamente, o vinho é um hobbie, tal qual o reflorestamento. Este que formou a floresta que cobre boa parte do restante das terras e serve de abrigo para animas dos mais variados como pumas, lobos, macacos… Biologia, era um interesse muito íntimo do barão, no qual ele colocou em prática em tais terras. Talvez por isso nossa intimidade com esse local.

    Outros espaços

    Além da fazenda, nós possuímos outros espaços ao redor do globo. Já falei aqui das fábricas, já falei de um pub ou outro e até de alguns apartamentos. Apesar deles, acho que nunca comentei de um lugar especial que fica na Europa e este, tal qual a fazenda merece um detalhamento, pois foi palco de uma aventura pouco antes da pandemia.

    Tal lugar é uma quadra em um centro urbano. Na parte acima da terra há prédios e comércios alugados e na parte do subsolo mantemos algumas garagens e salas fechadas para nosso uso. O lugar está longe de ser uma Bat Caverna, mas por lá existem algumas tecnologias, quartos confortáveis, no qual eu já utilizei no projeto “Escolhidos”. Lá também há alguns carros, motos e temos um certo acervo de armas e demais itens disponíveis conforme a necessidade.

    Como este local é estratégico, eu não vou nem mencionar o país, mas digamos que fica no hemisfério norte. Onde obviamente leva-se um tempo para se chegar vindo do Brasil. Outro detalhe superimportante é que ali em tal centro urbano há uma sociedade de vampiros mais organizada, então é um ponto bastante estratégico para o clã.

    Pois bem, aqui começa a introdução desta aventura. Algo que envolve bruxaria, magia e um vampiro amigo da época em que vivi em Berlin, chamado Julian. Este já foi o vampiro líder de Londres e depois de um tempo em tal função ele também tem se dedicado ao seu clã.

    Movimentando o status quo

    Semelhanças de gestão a parte, sempre nos identificamos e devido a proximidade de interesses e minha passagem pelo lugar, surgiu a oportunidade de trabalharmos juntos em algo que iria além de nossos clãs, algo focado na comunidade vampiresca. Tudo começou num papo em meus domínios com um membro dos regados, chamado Rudolf e aliado de Julian.

    – Sei que ambos os clãs namoram ideais anárquicos, mas apesar disso sempre estão conosco em temas coerentes, como a proteção aos anciões e a convivência harmônica com os outros seres. E é por isso que peço ajuda a vocês com relação há um grupo de radicais que buscam a supremacia vampírica e querem movimentar o status quo.

    Olhei para o Julian e soltei:

    – Meu grupo é pequeno, o de Julian não é tão diferente… não seria o caso de vocês pedirem apoio dos mais influente?

    – Esse é o problema meu jovem, esse grupo tem raízes na Europa, África e na américa do sul, estamos buscando alternativas para mitigar a influência deles nessas sociedades, haja vista, que percebemos membros dentro dos grandes clãs.

    – Sei, senhor… E o quanto aos recursos do Regrados vai estar em nossas mãos?

    – Aye, o que está em oferta pra gente se meter nisso, cara! – Apoiou-me Julian com seu sotaque típico de Yorkshire.

    – Fiquem tranquilos que a linha será aberta as necessidades dos senhores, naturalmente haverá benefícios em termos de visibilidade e território.

    Olhei para Julian e acenei em favor de tal empreitada. Pegamos mais detalhes e depois da saída de Rudolf, tratamos de montar uma estratégia.

  • Em resposta a Lilian

    Em resposta a Lilian

    Eis que os dias e noites passaram… Nesse meio tempo desde que fui possuído pelo espírito do Ari e com o tempo que passei junto da Pepe e seus treinamentos, eu comentei que teríamos uma reunião de clã. Bom, tal reunião serviria para ver quem ainda faz parte do clã e quem sabe renovar nossos laços de sangue.

    Apesar disso, tivemos de adiar. Lilian apareceu e trouxe novidades do seu sumiço. Sei que para ela e para quem leu, há uma pulga atrás da orelha quanto a sequência de nosso relacionamento. E nesse sentido resolvi trazer um pouco mais de detalhes. Inclusive, isso me fez tirar a poeira do equipamento e produzir um novo VampiroCast. Este aliás no qual vocês pode ouvir aqui em seguida ou continuar lendo, caso não seja possível nesse momento:

    Direito de resposta é o que chama? Talvez… mas tendo em vista que a Lilian abriu seu coração, como os humanos dizem. Resolvi fazer o mesmo…

    Vocês ainda não sabem tudo o que passei com Suellen, minha primeira esposa, pois obviamente isso está guardado a sete chaves e faz parte do final do Ilha da Magia, livro no qual devo terminar em breve. Sim, em breve!

    Mas o que isso tem a ver com a Lili e os dias atuais? Pois bem… Desde a época quando fui transformado, passando pelo meu casamento. Depois, teve a Julie, a Eleonor, a Beth, a Claire e até aquela jornalista meio doidinha que foi para o lado negro da força, se é possa chamar assim… Os meus relacionamentos têm sido tensos. Inclusive com a Lilian, que é o objetivo deste papo.

    Veja bem, alguém que está numa posição tal qual a minha, onde sou um vampiro. Onde enfrento todas as noites as consequências de ter sido transformado nisso, digamos que não posso me dar ao luxo ou pelo menos não me sinto confortável em ter um relacionamento, assim tão fixo.

    O mundo mudou sabe, mesmo nós não temos mais a pressão que existia antigamente para se casar e viver junto para sempre. No que diz respeito aos vampiros esse para sempre é muito longo, sabe?

    Enfim, numa noite dessas eu falei com a Lili, expliquei isso e acho que ela entendeu. Mais do que isso estou num momento de revisão de parcerias, nosso clã passa por uma fase de renovação de aliados. Alguns negócios e fabricas passaram por transformações em função da pandemia e isso toma muito tempo de mim.

    Acho que a pressão e o stress do momento tiram esse lance da minha cabeça… E seria mais uma pressão minha de não querer nada sério com ninguém agora em termos de relacionamento.

    Quem sabe, mais para o futuro quando toda a poeira desse movimento passar? Temos a vida eterna babe e se tiver que ser, será! Como diz o ditado…

    Fora isso, tô aqui na luta indo atrás de cada um do clã, na expectativa de que eles me deem boas notícias nas próximas noites.

  • Mente sã. Final – Perdendo o controle.

    Mente sã. Final – Perdendo o controle.

    Naquele exato momento eu vi um Ferdinand ir de surpreso ou tenso para sem palavras e nesse instante vi a chance de finalmente falar o que faltava. O vampiro na minha frente ficou sem reação e parecia esperar eu me explicar, mesmo que ele estivesse recebendo um golpe na garganta, Ferdinand pacientemente esperou cada palavra sair da minha boca como um golpe em seu ser.

    – Por anos eu achei que eu amava alguém e me apeguei nisso, enquanto tentava reconstruir minha vida na imortalidade. Todo esse tempo entre idas e vindas, batalhas, encontros e aprendizados eu vi que eu estava apenas me apegando em algo que na verdade não condizia com o que eu sentia até você aparecer… Eu tinha tanta certeza de tudo Fê… Eu achava que tinha tudo sobre controle e então eu te encontrei, ou melhor, fui encontrada por você e naquele instante eu tive que aprender a guardar algo que nem eu mesma entendia e hoje, depois de tanto tempo eu entendi, não era apenas admiração por você, eu comecei a sentir algo a mais com cada gesto seu, com cada ensinamento e com cada demonstração de carinho tua.

    – Lili eu…

    – Deixa-me terminar por favor, talvez eu nunca mais consiga falar tudo, então me deixa só terminar…

    Parecia que eu estava sendo rasgada de dentro pra fora, por um instante me senti humana de novo e vi aquela Lilian ainda menina, inocente e convicta que um dia iria casar, ter filhos e um marido carinhoso, ressurgir com um pingo de esperança brotando no meu íntimo.

    – Eu percebi naquele tempo que eu estava começando a sentir ciúmes de você com suas parceiras e não entendia o porquê. Pensava o que faltava em mim, o que na verdade nunca faltou nada além da coragem de aceitar o que eu estava sentindo por você. Como eu tentei afastar isso de mim, eu juro que eu tentei, você sabe muito bem como sou teimosa quando eu quero. A merda é que com você eu não consigo e me afastar por todo esse tempo foi pra ver se eu conseguia esquecer você e o sentimento que estava surgindo. Te garanto que não foi fácil, não está sendo fácil na verdade.

    Aqueles olhos azuis estavam em um tornado de emoções, eu conseguia ver, acho que em tantos séculos na vida desse vampiro, ninguém nunca falou algo tão direto, tão profundo que o deixasse sem palavras.

    – Fê, eu não estou te pedindo pra me amar e nem aceitar o que eu sinto, mas sim para saber o que meus sentimentos reais por você. Eu mesma desconhecia isso tudo até pouco tempo atrás quando foi insuportável não falar mais com você. Claro que eu sentia falta de alguns membros do teu clã, não todos, mas alguns, porém nenhum deles superava a falta que eu sentia de você.

    Se eu fosse humana ainda, provavelmente eu iria estar com o peito apertado querendo sumir dali correndo, só que a realidade era outra, sou uma vampira que já enfrentou batalhas, se machucou, se decepcionou e finalmente em meio à confusão da imortalidade achou alguém que fez tudo ser mais leve, mesmo não sendo meu, ele tinha esse dom. Como você tem esse dom e nem se dá conta às vezes.

    Não contamos tim tim por tim tim por aqui, porque são tantas coisas e detalhes que devem ser guardados, que o trivial basta. Escrever tudo isso e relembrar aquela noite em que finalmente me declarei para o Ferdinand me fez perceber que nem todo tempo do mundo afastada dele, valeria a pena ou mudaria algo dentro de mim.

    Seria em vão.

    Ele permitiu que essa história fosse publicada e eu permiti expor um sentimento que para alguns é algo inalcançável e que pra mim agora é uma realidade talvez solitária. Aquela noite eu me lembro como se fosse ontem; vi um vampiro experiente perder as palavras e ficar sem reação, porque afinal se nem eu mesma havia entendido antes de me afastar, quem dirá ele. Ficamos sentados ali naquele cantinho escuro com uma vela iluminando o que parecia uma eternidade de dúvidas em nosso breve silêncio.

    Eu senti um peso saindo das costas e outro entrando, porque no fundo eu sabia que talvez nunca fosse correspondida.

    – Eu não sei o que falar Lili…(pensativo) você realmente me pegou de surpresa como ninguém jamais o fez em anos…

    – Eu sei Fê… Eu mesma não entendia até pouco tempo.

    – Olha eu preciso processar tudo isso, é algo de mais pra mim agora…

     – Relaxa, eu entendo Fê, não estou te pedindo nada, apenas estou colocando as cartas na mesa.

     – Sem essa! Eu não quero que tu sumas de novo por conta disso! São muitos sentimentos juntos, sabe? É u preciso processar… Não me olha assim…

    Ele precisava entender, assim como eu precisei e naquele instante eu apenas fiz o que me foi o mais correto, me levantei, fui até ele e dei um beijo em sua testa e ele me olhou como quem se desculpasse, segurando minha mão não me deixando ir.

    – Quando você souber Fê, sabes bem como me encontrar. Por hora saiba que tens alguém que vai estar sempre aqui por você.

    Me doeu ir embora, assim como por uma última vez olhar para o rosto de quem me fazia sentir uma mistura de sentimentos e que eu sabia que me faria sentir mais uma vez a tal saudade brotar no meu peito. Ligar meu carro nunca foi tão difícil como naquela noite que fui embora deixando ele sentado e pensativo, digerindo tudo o que eu havia exposto. Em toda a minha existência eu nunca, como humana e imortal, jamais havia derramado meu coração assim para alguém como eu o fiz para o Ferdinand.

    Não importa quantos venham, quantas vão ou quanto tempo leve, se for para aparecer o amor dessa forma na nossa vida, ele vai vir e vai ser de uma vez só. Se algum dia as coisas mudarem e você, Ferdinand, sentir algo assim por mim, eu vou estar naquela velha mesa de bar sob a luz fraca ou de velas, te esperando.

    Tudo pode mudar noite a noite.

    Ass: Lilian.

  • Mente sã. Parte II – Olhos azuis.

    Mente sã. Parte II – Olhos azuis.

    A tal noite chegou e eu quando dirigia até o encontro, ficava repassando na minha cabeça o que eu iria dizer para o Fê e sinceramente eu não sei como, eu sentia um frio na barriga sem saber o que esperar da reação dele. Por mais irônico que fosse, combinamos de nos encontrar no mesmo bar que nos conhecemos pela primeira vez e aquilo por si só já me fez recordar noites não tão distantes e a ansiedade bateu me fazendo perder um pouco da coragem por um breve momento.

    Meu bom e velho Dodge estacionado e eu segui para a calçada do bar com minhas botas de cowboy, calça de couro, top e as várias tatuagens cobrindo parte do meu corpo como tradicionalmente me conhecem, me aproximando daquele local, obviamente sentindo a presença do vampiro que me fazia falta no “dia-a-dia”.

    Lá estava ele, sentado em um banquinho de frente para o bar e uma loira dando em cima dele, para variar. Eu me aproximei e vi que o Fê estava tentando educadamente afastar a moça que insistentemente queria ficar ali, porém logo desistiu pois percebeu que não iria dar nenhum fruto as cantadas dela. Força guerreira! Você vai achar alguém que caia nas suas cantadas de merda.

    Aquela camisa xadrez vermelha e preta, jeans rasgado, coturno, as tatuagens e sim, aquele sorriso que surgiu quando me viu aproximar. Por um instante eu não sabia mais como agir e ele na sua sabedoria de séculos e com um gesto carinhoso me deu um abraço que eu não sabia que sentia tanta falta. O cheiro dele continuava o mesmo, madeira e wiskey, um pouquinho de sangue talvez?

    – Cabelo preto Lili? Voltou aos velhos hábitos?

    Minha reação foi sorrir e confirmar que é sempre bom tentar voltar ao original. Ele como sempre fez uma piada e sentamos em uma parte mais afastada do bar, um local quase exclusivo para aquele momento. Eu como sempre acendi um cigarro para começar a conversa.

    – Vejo que continua destruindo corações Fê.

    – Pode até ser Lili, mas hoje minha intenção não é destruir corações… Queria te ver e saber o porquê saísse por aí e entrou no modo OFF por tanto tempo.

    Pra ser sincera naquele momento eu não sabia se eu conseguiria falar tudo mas achei que deveria começar pelo começo e ele como sempre, estava prestando atenção e com os pensamentos a mil, eu conseguia ver isso nos olhos azuis cortantes dele.

    – Sabe quando você precisa desligar um pouco a mente? Colocar os pensamentos em dia e talvez se reconectar consigo mesmo?

    Como se ele lesse a minha mente o vampiro levantou uma das sobrancelhas indicando que sabia que não era apenas isso. No fundo o Fê sempre suspeitou de algo que nem eu ou ele entendia ou não havia percebido, mas mesmo assim me deixou dizer o começo para de alguma forma eu criar coragem para falar além do óbvio.

    – Sei sim, mas acredito que não foi só isso, não é mesmo senhorita?

    – Não Fê, não foi apenas isso…

     – Lili, você pode confiar em mim e me contar o que realmente estava ou tá pegando. Eu não vou te julgar e muito menos te menosprezar. Sabes que eu jamais faria isso, ainda mais com você…

    Eu não conseguia desviar meu olhar dele, era impossível, o Ferdinand tem o dom de prender a atenção e ele sabe disso. Como sabe…

    Me ajeitei na cadeira tentando de alguma forma me sentir confortável pois, na verdade eu não estava. Sei que conheço ele faz algum tempo, só que nesse exato momento e depois de sumir por tanto tempo eu estava com receio, me faltavam palavras.

    – Eu precisava me afastar Fê… Eu me sentia sufocada, me sentia sendo julgada por coisas que eu não tinha culpa e comecei a entender alguns sentimentos que por estes anos eu sinceramente tentei fugir e bloquear em mim…

    – E você conseguiu ter sucesso em algum dos teus desafios?

    Por vezes naquele instante eu pensei em mentir. Será que valia a pena adiar mais um pouco? Ferdinand tinha os olhos fixos em mim, parecia ler minha mente e sua face antes mais rígida e em dúvida sobre o que eu estava falando, agora ficava leve me fazendo criar um pingo de coragem para finalmente desabafar tudo de uma vez e tirando do peito os anos de tanta solidão proposital.

    – Em alguns sim… Eu consegui me afastar das redes sociais, ajeitar tudo na Ordem, arrumar minha casa, ter um bom tempo pra mim mesma, ler alguns livros que estavam parados na estante e “respirar” um pouco mais aliviada…

    – Só isso Lili? Não tem mais nada? Eu estou aqui, confie em mim…

    Tem Ferdinand e eu fui me dar conta tarde demais ou talvez não. A verdade que eu não sabia é que o que era improvável, vir a ser real me derrubando com tudo no dia que vi o quanto você ama a Eleonor… Sim, por estes anos eu percebi que eu queria estar no lugar dela, me destruindo por dentro quando na minha solidão pelas noites a cavalo eu me pegava entre os “talvez” daquela realidade.

    – Não Fê, não era só isso… Teve um detalhe que eu não consegui vencer, por mais que eu tentasse por todo esse tempo.

     – E qual foi?

    – Esquecer você.

  • Mente sã. Parte I – O tempo acabou.

    Mente sã. Parte I – O tempo acabou.

    Faz um bom tempo que não pensava em escrever e aqui estou. Alguns anos se passaram e eu me afastei, porque afinal e apesar de ser imortal, eu preciso de sanidade mental, detalhe que durante minha curta estadia no Wampir por vezes foi testada. Mas é a “vida”, não é?

    Além de me afastar dessa vida virtual eu infelizmente me afastei também do dono desse universo, o Ferdinand e não foi porque eu simplesmente cansei dele, nada disso, eu precisava de um tempo longe dessa realidade e sinceramente, senti falta desse cara, porém, me mantive no meu canto longe da civilização curtindo a vida no campo sem lembrar que existia uma vida lá fora. Meus companheiros foram as noites a beira da lareira fumando um cigarro, tomando uma taça de “vinho”, wiskey, lendo algum bom livro, caminhando por entre os campos na companhia do Ghost, meu adorado cavalo, sendo antissocial e reorganizando a minha imortalidade. A minha sanidade e coração.

    Por estes dias enquanto eu olhava para meu velho celular decidindo se iria ou não retornar, me peguei sentindo saudades dele, sim desse vampiro que todas suspiram… Não somente dele, de alguns do clã do Ferdinand também, porém ele é quem mais me fazia falta. Nunca falamos muito sobre a nossa relação na época em que eu escrevia e era ativa nas redes sociais porque era algo novo para ambos e eu sinceramente não sabia o que sentia por ele. Depois desse tempo todo eu senti falta dele, das longas conversas, dos conselhos, das risadas, do fato que só ele e somente ele em pouco tempo comigo, sabia exatamente o que eu estava sentindo, era olhar para mim que o Ferdinand já sabia como conduzir a conversa.

    Foi então que esse meu estalo de saudade me fez ligar aquele bendito aparelho e ver se tinha algo relacionado ao clã do Fê, ou até mesmo dele… Sabe como é, a esperança é a última que morre. Quando liguei aquele mesmo velho aparelho com o mesmo número de anos atrás eu vi as mensagens dele e uma mistura de sentimentos me transbordaram e a confusão de tanto tempo me fez realizar, a merda que era sentir falta daquele sorriso, dos conselhos, dos abraços que só ele sabia me dar me apertando em seu peito, me fazendo esquecer o que estava me engasgando, ele sabia lidar comigo até melhor que o Trevor. Tempos atrás eu percebi o óbvio. Como eu gosto desse cara… Que raiva. Mistura de sentimentos e medo, saca? Temos medo também e não é da morte não, nem de longe, o medo que sufoca é aquele chamado sentimentos não correspondidos. É uma bosta bem grande.

    Tinham tantas mensagens, algumas querendo saber onde eu estava, como eu estava, mas uma me chamou atenção e foi aí que pensei “Preciso encontrar ele”.

    “Lili, eu não sei o que anda acontecendo, mas não fica nesse casulo pra sempre, cara. Quando quiser me encontrar chama ai e vamos colocar nosso papo em dia. Entendo seu sumiço, mas não entendo o real motivo. Kusses, Ferdinand.”

    Me afastei da Ordem, me afastei de tudo e tive um tempo comigo mesma, coisa que nunca fiz desde que me tornei vampira, talvez não tenha feito isso nem quando era humana e agora aqui por estes dias me dei o presente da paz de “espírito”. O Trevor e eu não estávamos mais juntos e sinceramente eu o amo mais como o meu parceiro do que qualquer coisa romântica, era algo de gratidão que sentia e por vezes confundi com o amor. São experiências que passamos e aprendemos com o tempo, por mais que demore. Os outros casos que tive tornaram-se boas lembranças.

    Enfim, depois de ler todas mensagens e essa em especial, criei vergonha na cara, troquei o aparelho velho por um novo e segui com o mesmo número, retomando contato com alguns membros do clã do Fê, como minha querida Becky, como eu gosto dela cara, sempre me aceitou de braços abertos, ficando extremamente chateada com minha ausência, mas no fim, entendendo os meus motivos e me dando total apoio para o que eu iria fazer.

    “Não importa o que aconteça Lili, eu vou estar aqui para te apoiar.”

    Depois de um dia com o retorno do aparelho celular nas mãos e me atualizando de algumas coisas eu criei coragem e finalmente mandei mensagem para o cara do sorriso que me destruía.

    F.O.D.A.

    “Oi Fê, tudo bem? Que tal nos encontrarmos e eu te conto o motivo?”

    “Finalmente! Saiu da toca Lili? Me fala onde e a hora, que vou pra lá. 😊”

  • Espírito: descarrego – final

    Espírito: descarrego – final

    Salvo algumas impressões iniciais e a intenção de que seria necessário fazer um descarrego em mim. Jaciara se mostrou uma pessoa/lobisomem bastante seca e concentrada. Sabe daquelas que não riem com qualquer piadinha e que não entram em discussões se não for para bater o martelo?

    Teimosias e jeito ríspido a parte, deixei ela com Carlos e Vera. Eles aproveitaram para pôr o papo em dia e eu resolvi me concentrar nos negócios. Apesar do espírito, estando ele agarrado em mim ou não, o mundo continua a girar.

    Liguei para Franz, que estava pelos EUA, não comentei nada sobre o descarrego ou possessões espirituais. Apesar disso, ele deve ter sentido meu tom de voz diferente e perguntou se estava tudo bem. Fugi do assunto e foquei no que precisava falar:

    – Sabe que daqui umas noites vamos ter aquele encontro do nosso clã?

    – Sei… (pausa dramática) tu ainda queres acordar a Audny, por causa do pedido do Georg, ou já superamos isso?

    – Eu fico com o pé atrás de não seguir o que ele tinha deixado proposto pra gente, mas só rola não fazer isso se for uma decisão conjunta do clã.

    – Nós dois tu queres dizer? Nenhum dos outros, nem o Sebastian está mais focado no clã.

    – Olha é um papo que podemos ter, quem ainda faz parte do clã? Você, eu… H2 e a Pepe. Sebastian e os outros tão fazendo o que de importante que as vezes nem respondem mensagens de “oi”?

    – Tá entendi maninho, é um papo pra colocar o pau na mesa e falar quem manda nessa porra?

    – Caralho, não Franz… é pra ver se a gente se une em prol de algo de novo. Senão eu sinto que só cuido dos velhos, das fábricas e do dinheiro. E todo o resto? Eu passei os últimos tempos com o Carlos, sabe o meu irmão? A matilha deles é super unida… (fui interrompido por ele)

    – Puta que pariu, vai vir de novo com esse lance de matilha, as merdas que os peludos fazem e tudo mais, brother?

    – Não cara, eu tô puto de fazer tudo sozinho, você tá me ajudando mais com as reuniões, a Pepe e o H2 também, mas e os outros?

    – Tá entendi. Nos falamos em breve então… não precisa de mais nada mesmo?

    – Não! Nos falamos em breve!

    Foi uma despedida bastante seca da minha parte. Refutei a ajuda dele na questão do espírito e segui fazendo meus afazeres. Estava puto pela conversa, mas era algo que sondava minha cabeça e precisava por pra fora. Pensei em pegar uma motinho de trilha que tenho na fazendo e dar uma extravasada, mas ao sair do escritório fui surpreendido pela Jaciara.

    Que venha o descarrego

    A lobisomem estava com outra roupa, um vestidinho florido que realçava ainda mais seu corpo magro e atlético. Rolou uma troca de olhares, mas antes que eu pudesse me manifestar ela segurou meu braço esquerdo com a maior força que tinha e praticamente me arrastou pra fora de casa.

    No lado de fora Vera e Carlos nos aguardavam. Ao me ver Carlos foi logo. Me tranquilizando:

    – Pedi pra Jaciara te chamar, acho que ela entendeu “puxar”.

    Ela completou:

    – Achei que o vampiro ia se enrolar e quero terminar logo com isso.

    – Caralho moça, era só ter pedido que eu vinha – Desabafei meio puto.

    Vera preferiu ser objetiva também:

    – Pelo o que conversamos vai ser rápido. Trabalhoso, mas rápido. Por favor sente-se ali Ferdinand. Ali dentro daquele circulo – Apontou.

    – Segura essa caixa e essa tampa ai. Teu único trabalho vai ser fechar ela quando for o momento certo. Você vai saber quando – Falou Jaciara.

    Sem mais delongas eles começaram uma dança. Carlos começou a entoar um cântico ritual, algo do tipo “Hey hey hoaa… hey hey hoaa…” e foi seguido quase que de imediato pelas duas. Em determinado momento da dança eles tiram as roupas. Depois percebi que eles começaram a se transformar e em alguns instantes eu estava ali, rodeado por um Lican meio canino e duas com feições felinas.

    O sentimento de nervosismo ou de fúria surgiu em mim. Porém, não tive vontade de se transformar tal qual eles, era mais como se algo me incomodasse… como se houvesse algum órgão doendo… como se eu estivesse com cólicas… como se o espirito estivesse se revirando…

    Tal sensação se ampliou a ponto de eu querer me transformar… Sim, os meus genes Lican ferveram! Veio a vontade de pôr algo pra fora. Veio a vontade de virar uma besta feroz igual a todos ao meu redor! Transformei-me e uivei! Talvez tenha apavorado os Ghouls da fazenda.

    Dizem que um vampiro que possui genes Lican tal qual eu, se transforma em algo próximo das bestas Licans, talvez uma versão menor e mais dentuça. Talvez com asas de morcego ou feições próximas. Dizem! Sei que me senti próximo deles, dos seus rosnados e da suas danças.

    E o tempo passou devagar naquele transe, como se algo me controlasse e mais do que isso, como se o descarrego estivesse ocorrendo em mim. Instantes depois eu sabia que estava liberto. Entendi que eles me observavam e que ali seria o momento de fechar a caixa. Sem jeito, como se fosse um gigante manipulando uma miniatura eu o fiz. Prendi Ari, como os caça fantasmas fazem nos filmes e fiquei tranquilo. Calmo e pacato a ponto de relaxar e voltar a ter aparência humana.

    O calor dos nossos corpos fazia o sereno evaporar da gente. Nus, nos entreolhamos. Dei uma leve risada, lembrei do vídeo/meme da Jéssica e comentei.

    – Já acabou Jaciara?

  • Espírito: Vampiro x Lobisomem – pt5

    Espírito: Vampiro x Lobisomem – pt5

    Meu período de sono e pensamentos foi rápido, devo ter ficado na cama umas 4h no máximo. Porém, foi tempo suficiente para o espírito de Ari me encontrar e sugerir algumas ideias: tortura, sacrifício, vampiro, lobisomem…

    Os dois últimos termos provavelmente foram em consequência do meu cotidiano e da minha convivência recente com meu irmão Carlos (Adolf) e de Vera. Além disso, minha fome estava aflorada, meus sentimentos conturbados e acordei com apenas uma coisa na cabeça: preciso de sangue!

    Levantei-me, coloquei uma roupa qualquer e lavei a cara algumas vezes. Vampiro não tem remelas, mas o fato de jogar água na cara dá aquela sensação de renovação, de limpeza… Acorda, sabe?

    Carlos e Vera estavam na sala. Acho que o sol ainda estava dando o ar da graça por mais alguns minutos. Sentei-me numa poltrona próxima a eles e tentei ser hospitaleiro:

    – Boa tarde ou noite pessoal.

    Carlos, sorriu e soltou um singelo “E ai meu irmão vampiro”. Já Vera me olhou e ponderou antes de se manifestar:

    – Boa noite moço! Pelo visto seu descanso não foi tão bom?

    – É me revirei em pensamentos descasados e acho que preciso me alimentar também.

    – Humm pois é Carlos, como estávamos falando é melhor chamar a Jaciara… Mas vou deixar o Carlos te falar disso Ferdinand, tô com fome também.

    – Jaciara, não lembro de nenhuma índia com esse nome na tua alcateia.

    – Ela saiu de lá faz um tempo. É daquelas que curte a vida na cidade, acho que na última vez que falamos estava pelo Nordeste. Bom, ela entende bastante de espíritos, ela foi aprendiz da Vera e depois a superou. Ganha a vida como vidente e geralmente anda com os ciganos. É uma lobisomem também, antes que pergunte.

    – Olha curti essa história, acho bacana toda essa vibe de videntes e ciganas e se quiser mando um helicóptero ou jatinho pegar ela onde estiver. Só que preciso muito de sangue, se não vai dar merda mano.

    Carlos com toda sua calma meio viajona:

    – Tá, boa. Aliás, quer ver quem encontra primeiro um cervo ou qualquer outro animal naquela floresta?

    – Só se for agora!

    Pausa para o lanche

    Carlos mandou algumas mensagens para Jaciara, que até o momento em que saímos não havia respondido. Deixamos as roupas na varanda e foi naquele momento conturbado que percebi a idade agindo sobre o corpo do meu irmão. Uma barriga estava saliente, muitos pelos brancos espalhavam-se por seu corpo e a pele já sobrava em algumas partes.

    Apesar disso, sua transformação em lobo foi rápida e nesta forma ele ainda parecia jovem e forte. Dizem que alguns lobisomens preferem essa forma e alguns a assumem como permanente no final de suas vidas. Talvez seja a animalidade deles que seja difícil de controlar na velhice, mas é apenas uma lenda e ninguém realmente gosta de discutir isso com um lobisomem velho, ou tem paciência.

    Decidi que seria mais justo se ambos estivessem na forma de lobo e foi nisso que me tornei. Quase todos os sentidos ficam mais aguçados nessa forma e foi fácil rastrear um javali. Animal difícil de pegar, ainda mais porque também havia uma onça na espreita.

    Situação que se tornou ainda mais complicada quando Carlos apareceu. Mordidas pra lá e pra cá, uivos, rosnados… Por fim consegui o sangue que manteria são por mais alguns dias e noites. Carlos aproveitou para fazer um lanche também. Ficou pensando se a onça ao fugir entendeu o que se passou ali entre nós.

    De volta a fazenda

    Depois, já de banho tomado, nos encontramos no meio da madrugada e Carlos veio ao meu encontro na varanda com notícias boas:

    – Posso mandar alguém ir pegar a Jaciara? Ela tá em Fortaleza.

    – Claro, deixa eu ver se o nosso piloto tá disponível de manhã.

    Instantes depois fizemos as combinações necessárias e ela seria trazida para a fazenda ao longo da tarde.

    Passei aquele dia entre uma mistura de cochilos, com momentos de inspiração onde eu vinha aqui no blog ou nas redes sociais para escrever algo.

    O final de tarde veio e com ele a chegada de Jaciara. Alguém que desde o primeiro olhar chamou minha atenção. Morena de cabelos lisos e compridos. Altura mediana e olhos castanhos claros. Ela vestia uma blusinha solta sem sutiã, com uma parte dentro do short… Sinceramente, havia sido uma bela e ótima primeira impressão. Até que nos cumprimentamos…. Nossos rostos se conectaram para um singelo beijo na bochecha, seguido de um abraço leve, que terminou num rápido empurrão por parte dela…

    – O que diabos tem em você, cara?

    Afastei-me, fiquei sem jeito e preocupado olhando para o que ela me falaria depois:

    – Vampiro… tens um espírito agarrado em ti…

  • Espírito: Alguém familiar – pt4

    Espírito: Alguém familiar – pt4

    Sabe aquele déjà vu, quando vemos alguém e este nos parece alguém familiar? Pois foi assim quando revi o espírito do Ari. Até então nosso contato havia sido muito mental, em alguns momentos passados eu nem o via, ou apenas algo disforme que emanava uma espécie de luz e se comunicava.

    Sobretudo, nesta vez ele tinha uma forma mais definida e em muito se parecia com aquele garoto negro que perambulou meu sonho/possessão. Outro ponto diferente é que ele parecia mais velho, talvez com a idade de um adolescente.

    Que fique claro, que estas minhas impressões ocorreram muito rápido e tão logo ele nos viu ele já foi se comunicando.

    “Finalmente veio ao meu encontro Fer-di-nand. Obrigado!”

    “Ari” Perguntei receoso.

    “Achei que na minha possessão do outro dia tinha deixado isso claro?”

    “Sim, um pouco. Inclusive fui atrás de umas ossadas, eram suas?”

    “Não sei. Preciso que me ajude a sair daqui… Depois de todo esse tempo sinto que estou sumindo. Ajuda eu Fer-di-nand”

    Naquele instante, alguns fatos começaram a fazer sentido. Eu queria mais respostas, mas o tempo dentro névoa disponibilizado pela Vera havia terminado.

    Novamente neste plano familiar

    Voltamos a fogueira, que estava com o fogo bem baixo e no horizonte o sol dava indícios que nasceria em breve. Pepe comentou:

    – Cara, que loucura foi isso? A gente, tipo, estava onde?

    Vera com toda suas calma respondeu:

    – Veja bem criança, ali é um lugar entre Gaia e o que há depois. Alguns chamam de limbo, outros de plano espiritual.

    Carlos mal deixou Vera terminar e já foi me perguntando:

    – E aí meu irmão, como foi, encontrou quem procurava?

    – Sim. Respondi-lhe apreensivo. Depois de uma pausa continuei. – Há algo de familiar nele e acho que ele está se desfazendo! Vera, nesse lugar os espíritos não deveriam vagar por longos anos e séculos?

    Todos me olharam com ar de curiosidade e depois de pigarrear, Vera comentou:

    – Cada ser tem seu desenvolvimento, acredito que este espírito seja novo e possivelmente seu tempo ali pode ser curto. Gaia e os Deuses agem assim, a vida é criada, desenvolvida e transformada. Sempre!

    Quando eu iria comentar algo Pepe me atravessou:

    – Hey, vamos continuar lá dentro? Já sinto um calor vindo do horizonte.

    Levantei a cabeça e olhei pensativo para o horizonte, de alguma forma aquele espírito havia se aproximado e mexido com meus sentimentos. Tínhamos de entrar, mas ao mesmo tempo eu queria resolver tudo o quanto antes.

    – Vamos. Comentou Carlos colocando a mão em meu ombro, eu te ajudo com isso meu irmão.

    Irmãos, aqui e onde mais precisar

    Contudo, voltamos pra sala principal da casa. Naquela manhã passei algum tempo revendo algumas quinquilharias que eram do sítio dos nossos pais. Foi algo nostálgico de uma época que se foi há tempos. Algo, que se levado em conta o contexto atual, mexeu muito comigo. Ainda mais com uma das preocupações levantadas por Carlos:

    – Não sei mais quanto tempo Gaia me reserva por aqui, mas sinto que devo te ajudar com esse espírito. Há algo nessa jornada que te fará bem.

    – Hey, você tá aí, velho e tal, mas forte… Tenho muitas coisas pra me preocupar e nem venha me falar em partir desse plano. Já basta o Ari, foca no Ari porra!

    – Tá desculpa, mas é algo que você precisa se atentar. Em algum momento vai acontecer. Enfim, pega lá os ossos que acharam!

    Trouxe a caixa para a sala. Carlos passou o dia neles e eu aproveitei a tarde para tirar um cochilo. Depois de tantas experiências eu comecei a gastar mais energia e a noite teria de me alimentar. Além disso ao acordar fui surpreendido pela vontade de entrar em contato com alguém familiar: o Doutor.

  • Espirito: pensamentos – pt3

    Espirito: pensamentos – pt3

    Anoiteceu. Acordei, levantei e fiquei por um tempo remoendo os pensamentos sobre o sonho/possessão que ocorrera. Sabe aquela impressão “Foi muito real”? Pois é, e em função disso chamei Carlos e trocamos uma ideia por alguns minutos. Em meio ao nosso papo Pepe apareceu com uma caixa e para minha surpresa lá estava um conjunto de ossos.

    – Hey garota como isso? Assim fácil?

    – Olha, na verdade não… Dei uns beijos num carinha lá e em seguida me alimentei dele… relaxa não matei… e não tinha câmeras lá no depósito.

    – Olha ela tão crescida que orgulho pro pai! (risos)

    – Aff que desnecessário! Mas olha ali, tem pouca coisa, só o crânio e maxilar meio quebrados e alguns ossos maiores, será que resolve pra algum ritual ou coisa do tipo?

    – Ahh deve resolver… Cara que falta o Zé me faz! Ele que era extremamente ligado nessas coisas, pensando bem… deixa eu ver o que o Hadrian está fazendo.

    Mandei uma mensagem para o vampiro e imediatamente ele me respondeu. Disse que ossos e almas não eram seus estudos, mas agradeceu pelo contato. Disse que estava com saudades desses meus “pasatempos”.

    Carlos, por outro lado, demonstrou interesse e gostou da ideia de viajar até a nossa fazenda. Desde então fiquei aguardando sua chegada, até que ele apareceu por lá junto de Vera.

    – Veja só quem aparece por aqui!

    – Belo lugar meu irmão… espera aquele filtro dos sonhos ali é aquele?

    – Simm, aliás tem mais coisa aqui, lá da casa dos nossos pais. Entrem, estão com fome?

    Pensamentos: Irmãos

    A noite foi diferente. Carlos interagiu bastante com Pepe, que inicialmente ficou receosa pela proximidade de um lobisomem em nossos domínios. Coisa que passou rápido em virtude das habilidades comunicativas dele. Nem parece mais aquele cara pacato, tranquilão e meio perdido nos pensamentos da adolescência.

    No dia seguinte, enquanto dormíamos, os lobisomens deram um rolê pela região. Vera queria ver a variedade da flora e fauna, enquanto Carlos passou um tempo revendo os artefatos que eu havia preservado e fazia alguns contatos com seus chegados.

    Acordei cedo, o sol mal havia se posto e tratei de me encontrar com eles. Ambos pareciam turistas em meio a um ambiente novo e diferente da sua realidade amazônica. “Vamos levar algumas mudas, algumas sacos com aquelas pedras. Olha, olha! Acho que são ossos de um tamanduá…”Disse Vera empolgada.

    – Acho que estou ficando velho e sentimental, me peguei por alguns momentos do dia revendo as coisas lá do sítio do pai e da mãe. Por que não me disse que ainda tinha isso mano?

    – Estava guardando pro dia que viesse pra cá. Viu aquela caixa ali? Acho que era uma das tua geringonças…

    – Clarooo, isso a mãe usava para apoiar o ralador de queijo… Acho que vi um parecido na cozinha?

    – Nossa, chegou a ir na cozinha também!

    – Tu esqueces que a gente come ne!?

    – Verdade! Hey, hoje conseguimos falar daquele assunto?

    – Sim, a Vera preparou um espaço lá fora, longe dos olhos dos teus criados.

    – Bom, muito bom! Vou resolver algumas coisas e lá pelas 22h nos encontramos por lá?

    Outro ritual

    Carlos concordou e eu voltei para o meu quarto/escritório, onde tratei dos meus assuntos. Perto da hora marcada fomos para o local preparado por Vera. Pepe também nos acompanhou e tão logo chegamos, já vestidos com os trajes recomendados, o ritual foi iniciado.

    Vera acendeu a fogueira, enriqueceu seu fogo com algumas ervas e pós. A determinado ponto ele ficou verde azulado e foi aí que entramos na névoa. Desta vez foi difícil de se locomover, o ambiente estava muito denso e no início até mesmo a comunicação parecia estar em câmera lenta e havia uma certa bagunça em nossos pensamentos. Situação que normalizou depois de um tempo por lá.

    “Ali” – Comentei para os demais.

    “Finalmente veio ao meu encontro Fer-di-nand. Obrigado!”

  • Espirito: uma possessão – pt2

    Espirito: uma possessão – pt2

    Alguns dias e noites se passaram desde a possessão de Ari naquele humano deslocado. Daquele momento em diante eu foquei meus esforços numa pesquisa acerca da região e obteve alguns resultados. Nada muito relevante se compararmos casos mais cabulosos vistos em tantos outros locais.

    • Ainda nessa?! – Comentou Pepe com ar de curiosa.
    • É… – Olhei  para o nada a medida que o som da letra saia desanimado da minha boca.
    • Nossa Fê que desanimo, vou te ajudar… manda ai o nome da rua.

    Ela pegou o endereço e ficou por uns 20 min navegando no smartphone. Ficamos um para cada lado jogados no sofá e quando eu já estava distraído com um seriado qualquer, ela deu um salto empolgada.

    • Olha isso aqui, vou te mandar pera ai…
    • “Ossada encontrada em escavação de terreno é levada para universidade…” Como tu achas essas coisas?!
    • Sorte talvez, mas prefiro dizer que são os termos certos na busca, meu caro!
    • Ótimooo, preciso… aliás você tem cara de universitária ne… Me ajuda nessa?
    • Lá vou eu…
    • Relaxa só precisa dar um pulinho lá e ver se acha os ossos.
    • Ahhh super fácil, vai nessa hahaha!

    E lá foi minha pupila por algumas noites no campus da universidade citada na matérias que ela havia encontrado em suas buscas. Do meu lado eu continuei as pesquisas e não havia nada de mais relevante se comparado com esses casos.

    Inclusive num dos dias fui dormir meio frustrado pela falta de informações, quando entre um sonho e outro fui possuído.

    A possessão nos meus sonhos

    “Eu estava numa maca ou cama de solteiro, meus braços e pernas estavam amarrados e por mais força que eu fizesse era impossível se soltar.  A pouca luz que vinha das frestas de uma porta ao meu lado me mostravam um lugar que parecia pequeno, mas seco.

    Os minutos se passavam e eu divagava nos meu pensamentos, alguns deles nem eram meus, como se eu tivesse outro passado, sim eu era outra pessoa ali e estava em meio a uma possessão. A lembrança de um garoto negro, perto dos 3 ou 4 anos correndo e brincando dentro de uma casa era nítida.

    Uma mulher branca aparecia por vezes e na presença dela o garoto ficava nitidamente com medo. Por vezes ele se escondia dela e por vezes ele apanhava… Senti as pernas formigarem em alguns momentos como seu mesmo estivesse levando a surra dele.

    Estive por muitos minutos naquela maca, até que a porta se abriu e uma forte luz iluminasse o lugar. Aquilo me cegou temporariamente, até que em minha frente surgiu uma figura misteriosa, suas feições me lembravam alguém familiar…Em suas mão uma faca grande… Eu tentei falar ou gritar, mas da minha boca não saiam sons, apenas gemidos internos, como se ela estivesse colada…”

    Acordei sufocando, como se minha respiração estivesse voltando… como se eu fosse humano novamente… como se eu estivesse sendo sufocado por alguém ao longo da possessão… alguém familiar.